quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

O método por trás das leis #01 - Como sabemos que a Terra gira em torno do Sol?

Como sabemos que a Terra gira em torno do Sol?

Por: Gabriel Uri Brito Davansso - "O método por trás das leis #01"


  Afinal todos os livros de ciência nos dizem que a Terra gira em torno do Sol, não? Deve ser verdade! Bem, se for o caso eu edito um livro de ciência e coloco que sou o líder supremo da galáxia, imagina se dá certo? Como sabemos qual modelo é o certo? E por quê? São perguntas importantes.
Mais importante que saber algum fato científico, é entender como ele foi descoberto.

  • O modelo geocêntrico

  •   O modelo geocêntrico consiste na ideia de que a Terra é o centro do universo e foi a visão predominante até meados do século XV.
   Em uma análise superficial, o modelo geocêntrico faz sentido; a Terra não parece se mexer. Escolha uma pessoa aleatória isolada da sociedade e ela certamente lhe dirá que a Terra não se move. Outra coisa que nos dá essa impressão é a falta de "paralaxe¹" das estrelas.  

¹Paralaxe é o deslocamento de um objeto quando se muda o ponto de observação, você pode observar isso ao colocar seu dedão na altura dos olhos e usar apenas o olho esquerdo para observá-lo, depois trocar para o direito: O dedão vai mudar de posição, pois cada olho está em um lugar. Como na figura.
Imagem: nautilus.fis.uc.pt/cec/teses/joana/prototipo/estereoscopia.htm

   Ora, passam-se meses e meses e as estrelas parecem não mudar de lugar. O argumento dos gregos da antiguidade era que caso a Terra se movesse, a posição aparente das estrelas deveria mudar de lugar. Ela muda, mas não o suficiente para você perceber a olho nu, pois estão absurdamente distantes. Pode-se perceber isso na Lua: mesmo andando quilômetros ela ainda parece estar no mesmo lugar porque está muito distante para notarmos alguma diferença significativa.
   Na antiguidade, os gregos consideravam as formas arredondadas como o círculo, a circunferência e a esfera como perfeitas e as mesmas apareciam muito em sua cosmologia. Merece destaque dessa época o filósofo Aristóteles de Estagira( 384 a.C - 322 a.C ). Para ele a Terra estaria parada ocupando o centro do Universo e as órbitas seriam circulares com movimento uniforme(A perfeição grega).
Modelo Aristotélico. Fig. 2
   Porém, esse modelo tinha várias falhas, sendo que a principal não explicava o movimento retrógrado dos planetas como Marte. Em certos períodos, Marte aparenta "voltar" e depois seguir em frente, um movimento não explicado por esse modelo.(Fig. 3 e 4)
Imagem: NASA/JPL-Caltech
Imagem: NASA/JPL-Caltech. Fig 4

Anos mais tarde, Ptolomeu apresentou o seu modelo para tentar explicar esse movimento. Ele utilizou epiciclos: órbitas circulares dentro de órbitas circulares(pois é). A Terra não estava mais no centro, estava levemente ao lado, porém os planetas ainda giravam em torno dela. Nas próximas figuras pode-se observar que era uma explicação muito complexa, mas satisfazia a ideia geocêntrica. Como eu disse anteriormente, fazia muito sentido que a Terra ficasse no centro para a maioria das pessoas daquela época.
As órbitas planetárias segundo o Modelo Ptolomaico.
Caóticas, na imagem elas estão levemente modificadas
para parecerem visualmente mais agradáveis, na verdade
é muito pior que isso. Um modelo muito forçado para
ser o verdadeiro.

por Gabriel Uri
O modelo Ptolomaico, (Feito por mim)
Eis que em 1543 o modelo Heliocêntrico foi proposto por Copérnico, sem muitas mudanças do modelo de Ptolomeu, com exceção que o Sol agora estava no centro. Contudo ainda havia falhas. O movimento dos planetas não batia com o modelo copernicano(Realmente, não era melhor que o de Ptolomeu). Até que Galileu finalmente mostra observações satisfatórias de que a Terra gira em torno do Sol.

  • Galileu e a defesa do modelo Copernicano (Heliocentrismo)

 Há um princípio lógico usado por cientistas que prova facilmente que o modelo geocêntrico está errado: a Navalha de Occam. Como muita gente não vê sentido nela logo de início, eu vou antes mostar que ela funciona. Basicamente a navalha de Occam nos diz: 
"Se em tudo o mais forem idênticas as várias explicações de um fenômeno, a mais simples é a melhor"
Ou seja, ela afirma que entre duas hipóteses, aquela com a menor quantidade de suposições deve ser selecionada. Seria mais ou menos quando você vai contar uma história e exagera: quanto mais você fala, mais longe da verdade está. Pela navalha já dá para notar que o modelo de Ptolomeu seria excluído por ser muito complicado, mas vamos demonstrar o motivo.
  Em 1610, Galileu Galilei publica Sidereous nuncius onde descreve suas observações astronômicas que contrariam várias concepções de Aristóteles sobre o universo que, até então, tido como geocêntrico. Entre as observações realizadas, destacam-se por ir contra alguns conceitos da época:

    Manchas solares. Imagem: solar-center.stanford.edu
  • Manchas Solares: Sim: Galileu observou o Sol. Claro que não diretamente senão seria a última coisa que veria. Ele refletiu a imagem do tubo de sua luneta para um pedaço de papel e notou manchas no Sol que se movem, contrariando a concepção aristotélica do céu como um reino da perfeição e das formas perfeitas.



  • Fases de Vênus: As observações de Galileu permitiram notar que Vênus, assim como a Lua, apresenta fases. Uma explicação razoável para esse fato envolvia necessariamente a ideia da Terra em movimento. Primeiro: Podemos ver Vênus pois ele reflete a luz do Sol e planetas não emitem luz própria. Segundo: durante sua mudança de fases, às vezes Vênus está mais longe da Terra e mais perto do Sol. Como podem ambos, Vênus e o Sol, orbitarem a Terra, mas Vênus se mover mais longe? Isso pode até ser explicado através de epiciclos, mas os movimentos seriam muito mais complexos e não há nada na física que influencie o movimento dos planetas de tal maneira. Porém com o heliocentrismo a explicação fica muito mais clara(Mais um ponto pro heliocentrismo).
    Fases de Vênus. Fonte: oneminuteastronomer.com

  • Júpiter e seus satélites: Para mim a mais convincente. Ao observar Júpiter, Galileu descobriu quatro luas que o orbitavam (hoje sabemos em torno de 63). Isso seria a prova que nem todos os corpos celestes giram em torno de um privilegiado(A Terra ou o Sol). Ou seja, nem todos os planetas têm o mesmo centro, havendo vários centros diferentes, à semelhança de Júpiter para suas luas. Caso tenha um telescópio, é fácil indentificar Júpiter e as luas, mas aqui vai uma foto:
Júpiter através de um telescópio


 Após Galileu, outros astrônomos que aperfeiçoaram seu modelo cosmológico tornando-o cada vez mais próximo da realidade, como Tycho Braher, Johannes Kepler, (demonstrando que as órbitas são elipses e não círculos) Isaac Newton etc. Eu poderia dar uma aula enorme provando que a Terra gira em torno do Sol (é simples provar através de cálculos), mas, ao invés disso, vou colocar mais duas evidências: Uma sem matemática, outra com.


  •  A diferença de tamanho do Sol visto entre Marte e a Terra
Essa é sem matemática e apesar de menos convincente é fácil de fazer em casa(números são mais objetivos que observações). Tire uma foto do Sol, tentando enxergar o seu disco, um jeito de fazer isso é ajustando a exposição da câmera ou tirando perto de uma parede(Ou simplesmente veja a foto abaixo).
Foto tirada por mim.
É possível ver o tamanho aparente do Sol. Agora compare com o Sol visto em Marte:


Bem menor, não? As fotos evidenciam que Marte está muito mais longe do Sol do que a Terra. O tamanho aparente do Sol (ou tamanho angular para ser mais técnico) varia muito pouco conforme o passar do tempo e, de acordo com o modelo geocêntrico, Marte passaria muito próxima do Sol em alguns períodos, o que não acontece. 
Claro que só a capacidade de enviar um robô para outro planeta já é prova que sabemos o suficiente para confirmar o nosso sistema Solar heliocêntrico.



  • Usando a Física e a Matemática para provar (pule para a conclusão caso não goste das matérias ou veja mesmo assim e aprenda, sua escolha)
Fácil de fazer em qualquer lugar. Agora o Sol já foi embora então não vou poder tirar fotos do experimento, apenas mostrar o procedimento e algumas imagens. Talvez no futuro eu faça e coloque o link aqui.

Vamos lá:
 Pegue algo opaco(que não deixe passar luz) e faça um furo. Coloque-o contra o Sol de forma que ele projete sua imagem em uma folha de papel e meça:

  •  o diâmetro da imagem 
  • a distância entre o papel e o objeto opaco.

(A maioria de vocês devem ter tido essa matéria no colegial, até mesmo no fundamental.)
Agora é basicamente uma semelhança de triângulos.
 A distância Sol-Terra é (em média, pois varia) aproximadamente 149.600.000 km
Basta aplicar na seguinte fórmula:



Diâmetro da Imagem          Diâmetro do Sol
--------------------------  = ------------------------ 
Distância Objeto-Folha    Distância Sol-Terra


Achei um experimento similar na internet com outro propósito mas nos dá os valores que precisamos para trabalhar e dão certo. (não é a distância exata mas é sempre bem próxima) 
Fonte: 
http://www.ifa.hawaii.edu/~barnes/ast110_99/homework/ans3.html
Diâmetro da Imagem = 1cm = 0,00001km e Distância Objeto-Folha= 100cm = 0,001km


1.496.000 km, se pesquisarmos veremos que na verdade é 1.392.000 km. Ou seja, uma diferença de 7% (O próprio site diz que é esperado uma diferença de até 10%. Foi bem preciso).
Mas para quê serve isso? Bem, o diâmetro da terra é de 12.742 km, (Se não acredita em mim ou em nenhum lugar da internet que diz isso, eu farei futuramente uma postagem de como chegar a esse resultado. Aqui ficaria muito grande) ou seja, a estrela tem o diâmetro aproximadamente 109 vezes maior que o da Terra sendo muito maior e mais maciça. Pela lei da gravidade não faz o menor sentido a Terra fazer o Sol girar em torno dela, portanto, essa é uma das melhores provas que temos: Números.


  • Conclusão
 Selecionei as evidências mais fáceis que demonstram que a Terra gira em torno do Sol e não o contrário. 

Pode-se notar que o geocentrismo não consegue se sustentar; sempre há uma explicação melhor. 

Lembra da Navalha de Occam? Ela funcionou: O heliocentrismo precisa de muito menos argumentos para poder se sustentar do que o geocentrismo. Basta olhar o modelo Ptolomaico novamente, parece algo que você veria em um quadro de Jackson Pollock (pesquisem). É desnecessariamente complexo e as leis da física não explicam alguns movimentos como o epiciclo

Pode-se dizer que para esse modelo dar certo, teríamos que fazer várias "gambiarras" na física, ou seja, achar muitas desculpas para tentar provar que está certo. O modelo heliocêntrico consegue ser provado muito mais facilmente e não é contrariado em nenhum momento.

Farei mais desses textos provando o que os livros de ciências nas escolas ensinam pois, como já disse anteriormente, Melhor que saber algum fato científico, é entender como foi descoberto. 
Caso algum amiguinho insista em falar que a Terra é o centro do universo, use o que aprendeu aqui. Ah, e caso ele apresente algum argumento que não tenha sido discutido aqui, por que não entrar em contato?



Esse é o primeiro texto de uma série de textos que planejo escrever: "O método por trás das leis."

Um pouco das fontes usadas:

  • FARA, Patrícia. Uma breve história da ciência. Editora Fundamento Educacional LTDA, 2009
  • Ser Protagonista: Física do Ensino Médio III. Editora SM, 2014
  • ALLAIN, Rhett. How do we know the Earth orbits the Sun? wired.com 2014
  • E. BARNES, Joshua. Answer 3. Angular size of the Sun. ifa.hawaii.edu 1999

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